1. Dividirás o teu território utilizando um critério funcional: a cada zona atribuirás uma função. Assim, a tua cidade não existirá como um organismo característico em que cada parte (como que analogicamente) espelha o todo, mas como um “suporte” para circuitos de experiências isolados uns dos outros; para os mais ricos, elevados e máquinas voadoras encimarão os circuitos dos mais pobres.
2. Investirás toda a tua verba de infra-estrutura de transportes em asfalto e só em asfalto; isso contribuirá para a transferência de renda para os mais ricos e consumirá a verba que poderia ir, imprudentemente, para transportes efetivamente públicos (trens, bondes, linhas hidroviárias, bicicletários, etc.).
3. Os teus vereadores “ajudarão” o empresariado com as externalidades* dos seus negócios; adensa-se assim a teia de proteção dos viscondes e barões habitantes dos bairros ditos nobres, proteção sem a qual o curso natural das coisas (haver um grupo arbitrariamente dominante) poderia ser quebrado pelas hordas bárbaras da participação informada e efetiva.
4. Impedirás qualquer lei cujo fim seja combater a especulação imobiliária.
5. Permitirás que se construam prédios altos sem previsão de usos diversos no andar térreo, de maneira a contribuir para o desinteresse de cada quarteirão para a população em geral.
6. Deixarás o espaço visual e auditivo absolutamente livre à publicidade - e à propaganda!
8. Espalharás não-lugares – condomínios horizontais, freeways, grandes superfícies de comércio – de modo a contrair os espaços públicos, a identificação das pessoas com o seu território e a vivência desse território num tempo humano pleno de contactos: as cidades, afinal, devem ser equivalentes e intercambiáveis, de preferência sem que os co-habitantes se conheçam e interpelem demasiado, para que as pessoas estejam saudavelmente mais disponíveis a realocações e reengenharias.
9. Deixarás os serviços e estruturas mais básicas (saneamento, educação, saúde) sempre para depois: primeiro construirás cartões-postais que beneficiem a publicidade de futuras instalações hoteleiras, campos de golf e empreendimentos imobiliários em encostas de morros, à beira-mar e em santuários biológicos.
10. Atrairás O Turista não em razão do que és, mas com o que achas que O Turista quer, e te travestirás para ele: não alimentarás, portanto, uma forma de vida que exiba particularidades.
(Ludwig Heinrich Aminbergerhausen, in Carta de Esparta - Manifesto para um Novo Urbanismo, para uso do Príncipe Charmoso e Civilizado, 1927 – importante documento de teoria arquitetônica do brilhante arquiteto de Nichtstenstein, que tanto influenciou o nosso genial arquiteto Blocus Nieumeiquer).
Um comentário:
O mandamento 10 ainda reeeennnde...desde que o paraíso açoriano saiu na Veja eleito exemplo de qualidade de vida e a prefeitura-publicitária local decidiu seduzir o público-alvo.
Será que estão encontrando nisso uma vocação inata pra ilha?
abraço Rafael
Othon.
http://www.kindertraum.blogspot.com/
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