Vale a pena estar um tempo em Florianópolis. Está tudo lá, em tempo real, uma vez mais - por ser estudado como os geólogos estudam amostras de caudas de cometas para entender como chegamos até aqui. O passado no presente. E acelerado. Refiro-me ao modelo perverso de crescimento das grandes cidades brasileiras nas últimas décadas.

18 fevereiro 2006

Quiasmos florianopolitanos



Quanto mais viadutos, mais carros. Quanto mais carros, mais viadutos.

Quanto mais especulação imobiliária, mais guetização por faixa de renda. Quanto mais guetização por faixa de renda, mais especulação imobiliária.

Quanto mais boom imobiliário, menos planejamento urbano racional. Quanto menos planejamento urbano racional, mais boom imobiliário.

Quanto mais carros, mais stress para todos. Quanto mais stress para todos, mais carros.

Quanto mais Santinho, menos Ribeirão. Quanto menos Ribeirão, mais Santinho.

Quanto mais segurança privada, menos segurança. Quanto menos segurança, mais segurança privada.

Quanto mais corruptível o vereador, mais poderoso o empresário corrupto. Quanto mais poderoso o empresário corrupto, mais corruptível o vereador.

Quanto mais a cidade como patrimônio comum se divide, mais condomínios horizontais. Quanto mais condomínios horizontais, mais a cidade como patrimônio comum se divide.

Quanto mais edificações monofuncionais, menos interessantes as ruas. Quanto menos interessantes as ruas, mais edificações monofuncionais.

Quanto mais shoppings, menos comércio de rua (iniciativa local, mais empregos, desconcentração de renda, vitalidade a cada quadra). Quanto menos comércio de rua, mais shoppings.

Quanto mais folders anunciando qualidade de vida, menos vida com qualidades. Quanto menos vida com qualidades, mais folders anunciando qualidade de vida.

Quanto mais zoneamento (para habitação, comércio, circulação), menos simpáticas e seguras as ruas. Quanto menos simpáticas e seguras as ruas, mais zoneamento.

Quanto mais propaganda da Prefeitura em agências de publicidade, menos comunicação a sério. Quanto menos comunicação a sério, mais propaganda da Prefeitura em agências de publicidade.

Quanto mais infraestrutura rodoviária, menos transportes públicos (trens, bondes modernos, ferry-boats). Quanto menos transportes públicos, mais infraestrutura rodoviária.

Quanto mais Corrida do Ouro imobiliário, mais longe habita a patuléia (2 hs. do trabalho). Quanto mais longe habita a patuléia, mais Corrida do Ouro imobiliário.

Quanto mais reconstróem alphavilles aqui, mais a cidade se privatiza e as populações são expulsas. Quanto mais a cidade se privatiza e as populações são expulsas, mais reconstróem alphavilles aqui.

Quanto mais Balneário Florianópolis, menos Cidade de Florianópolis. Quanto menos Cidade de Florianópolis, mais Balneário Florianópolis.

Obs.: "Patuléia", na terminologia do Élio Gaspari, são os subcidadãos que ficam de fora do esquema patrimonialista de transferência estatal de renda para os mais ricos na República brasileira.

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